FlutuoConsigo deslindar o meu gosto sem esforço Balanço é o que a maré me dá E eu não contestoO meu destino está fora de mim Eu aceitoSou eu despida de medos e culpas Confesso Hoje eu vou fingirQue não vou voltar Despeço-me do que mais queroSó para não te ouvir dizer Que as coisas vão mudar Amanhã (...)
Amanhã pensar nisso sempre me dá mais jeito Fazer de mim Pretérito Mais Que Perfeito. (...)
Hoje eu vou fugir Para não me dar a vontade de ser tuaSó para não me ouvir dizer Que as coisas vão mudar Amanhã
Atrevo-me a escrever que talvez perceba uma das reflexões a que se referia essa grande alma criadora...
Realmente ao longo da vida vamos dividindo a nossa alma em várias... criamos uma alma para cada contexto que habitamos... e vamo-nos repartindo.
Chegamos a um ponto em que já não sabemos mais onde pertencemos... queremos assumir cada parte da alma que temos, mas é difícil...
Uma alma tão repartida acaba por se desintegrar, e acabamos por ficar perdidos por entre os mil caminhos que traçamos...
E com tantos mundos para viver acabamos por não viver.
Queremos habitá-los todos, se possível ao mesmo tempo... mas eles entram em confronto e alguns contradizem-se... e não conseguimos habitar nenhum...
E nesse emaranhado de caminhos, de viveres, de emoções, vai crescendo um vazio... um vazio que se torna tanto maior quanto a vontade de querer viver em todos os lugares... e acabamos por não viver verdadeiramente em nenhum...
De tão intensamente que queremos viver, torna-se superficial a nossa existência...
De tanta vontade que temos em deixar a nossa marca, acabamos por perder os melhores momentos... Porque corremos, não paramos de andar de um lado para o outro, de querer fazer e viver tudo e sempre...
E acabamos mesmo por não fazer nada, por não viver nada...
A única coisa que se vai acentuando é o vazio – um vazio cá dentro que tanto ansiou a intensidade que lhe permitiu passar dos limites...
Não há retorno, apenas solidão... E agora tudo depende do que fizermos para ultrapassá-la ou para conseguir viver com ela...
E chega-se à derradeira conclusão de que é quando pensamos ter tudo, fazer tudo, conseguir tudo...
É precisamente aí que não temos nada...
Perdida…
Perdida por dentro...
Segura, muito segura por fora...
Avança... sempre sem medo... sabendo que o que aparecer será ultrapassado...
Mas ninguém sonha a angústia que sofre...
O medo que tem...
A busca intensiva por um caminho entre mil...
E não sabe que fazer... por onde ir... o que pensar... o que fazer... o que dizer...
Nao consigo dominar
Este estado de ansiedade
A pressa de chegar
P'ra nao chegar tarde
Nao sei de que é que eu fujo
Sera desta solidao
Mas porque é que eu recuso
Quem quer dar-me a mao
Vou continuar a procurar
A quem eu me quero dar
Porque até aqui eu só:
Quero quem quem eu nunca vi
Porque eu só quero quem
Quem nao conheci
(...)
Esta insatisfacao
Nao consigo compreender
Sempre esta sensacao
Que estou a perder
Tenho pressa de sair
Quero sentir ao chegar
Vontade de partir
P'ra outro lugar
Vou continuar a procurar
A minha forma
O meu lugar
Porque até aqui eu só:
Estou bem aonde eu nao estou
Porque eu só quero ir
Aonde eu nao vou
(...)
Porque eu só estou bem
Aonde nao estou
No decorrer deste mistério que é a vida, muitas vezes sucede que nos sintamos caminhar na direcção contrária... Na direcção contrária aos nossos princípios, aos nossos valores e mesmo às nossas vontades.
A verdade é que, na realidade pensamos e sentimos que estamos a ir na direcção certa, sentimos que o que fazemos é o que queremos, e culpamos os outros de não serem aquilo que desejámos que fossem, o que idealizamos e, posteriormente, acreditámos que fossem...
Agimos... e depois pensamos, ao invés do contrário, do correcto.
E a isso chamo desencontros.
Desencontros daquilo que somos com aquilo que pensamos ser; desencontros da nossa essência com a imagem que assumimos...
E desses desencontros fazemos amizades, criamos interesses, mas todos trocados. As pessoas acabam por rodear-nos apreciando aquilo que parecemos ser... acabam por não nos conhecer realmente... e acabam por querer de nós o que não lhes queremos dar, e por não nos dar o que realmente queremos.
Desencontros puros e concretos... desencontros de vontades e de disponibilidades... desencontros nascidos do sonho, da idealização, da busca do que não existe... desencontros que criamos para nós próprios e que apenas nós podemos “desmascarar”, “denunciar” e “abolir”... Desencontros que aparentemente nos fazem felizes... e nos fazem sentir bem... contudo... logo percebemos que se trata de uma felicidade pobre, sem raízes, do momento... que rapidamente desaparece. E por isso mesmo, lhes chamo desencontros...
Desencontros do querer com o fazer... da ansiedade com a aparência... da realidade com a verdade... Desencontros cruéis, espontâneos, poderosos, influentes, e muito marcantes...
Desencontros que ao fim e ao cabo não passam de encontros de vontades diferentes, de medos diferentes, de pensamentos diferentes que acabam por se fundir e dar origem a momentos aparentes de sintonia... e só depois, depois... depois é que se pensa e se analisa e se reflecte e se percebe que nada havia de comum – foi apenas mais um desencontro.
Um desencontro malvado que só faz sofrer e identificar a dificuldade que temos em entender os nossos próprios pensamentos, as nossas próprias vontades e a maneira como ansiosamente organizamos as nossas acções de modo a que tudo bata certo...
E nada está certo... tudo está fora do sítio... e tudo nos traz conflitos porque nada é feito como deve ser... e como deve ser significa: como os nossos princípios e os nossos valores mandam... como deve ser significa: ver o que realmente sentimos e pensamos e só depois agir...significa: elevar a pureza dos nossos sentimentos e a clareza dos nossos pensamentos de modo a fazermos aquilo que queremos na verdade e que, por isso mesmo, nos faz bem...
Mas a vida é mesmo assim... temos o instinto da sobrevivência – de decidir no momento o que fazer, porque, no momento, é o que nos fará “sobreviver”... E no fim de contas, o problema é mesmo esse: sobreviver para aferir mais um desencontro...
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